Fazenda agroecológica Arimuguê – Foto: Divulgação
POR – LÉA PENTEADO*, PARA NEO MONDO
‘Terra, terra pela proa
Avistei terra distante e areia de Lisboa
Eu avistei uma terra de muito longe se ver
Avistei os dois irmãos e outeiro do Arimuguê…’
Esta canção, usada nas encenações da Chegança*, uma festa onde os marinheiros celebram o retorno à terra firme após uma tempestade, faz referência ao Arimuguê, um córrego em Santa Cruz Cabrália que, segundo os indígenas, significa água mansa. O córrego deu nome à fazenda, distante pouco mais de 3 km do centro da Vila de Santo André. Tudo começou em 1966 quando Hamilton e Dolores, nativos da cidade, recém-casados, compraram as terras para começarem a família. Construíram uma casa, desenvolveram a atividade rural, tiveram 5 filhos, e por muitos anos dividiram-se entre a roça e a cidade, onde tinham um pequeno comércio. Os filhos cresceram, partiram e a fazenda continuou produtiva. Mas a pandemia deu um grande impulso quando um dos filhos, Carlos André do Rosario Santana, psicólogo e sexólogo, morando nos Estados Unidos, veio passar uma temporada com os pais acompanhado do seu marido, o agrônomo e doutor em fitopatologia, Jean-Philippe Marelli.
A fazenda, que já tinha base de sustentabilidade, se tornou ainda mais sustentável. Não apenas pelas placas de captação de energia solar e eólica, mas sobretudo pela criação do “Projeto Arimuguê”. A fazenda de agricultura familiar, se transformou em agroecológica, num trabalho conjunto de agricultores e conservacionistas conscientes da importância da agroecologia e agricultura regenerativa, cuidando do solo, respeitando os ciclos naturais das plantas e dos polinizadores. Localizada dentro da APA Santo Antônio, inserida na mata atlântica, a maior parte de sua área está coberta com mata nativa e ainda recebe os benefícios do brejo do rio João de Tiba, pelo qual se atravessa de balsa para chegar à orla norte de Cabrália, onde estão os bairros de Santo André, Santo Antônio e Guaiú e também o município de Belmonte.
Com a visão exuberante do mar e da mata atlântica, a fazenda tem em sua entrada o meliponário onde se pode saborear com um canudinho o mel de Uruçu amarela que está sendo produzido em colmeias que dividem o espaço com árvores de cupuaçu e pimenta do reino. As abelhas sem ferrão são perfeitas para polinização e este tema e sua relação com as plantas, os processos, as diversidades e a iniciação à criação racional, será apresentado pelo Jean-Philippe e o Carlos no 2º Forum Maps, dia 16 de setembro. A proposta é abrir uma janela para o mundo da polinização e da criação de um mundo regenerativo por meio dessa prática.
O Projeto Arimuguê, além do meliponario (colmeias de abelhas sem ferrão) e apiário (colmeias de abelhas Apis ), tem também uma horta orgânica onde pimentões vermelhos, temperos diversos, tomates, 5 espécies de maracujá, coqueiros e bananeiras convivem harmoniosamente. No lago de criação de tilápias, um jacaré se instalou quando ainda filhote, e hoje, com quase 2 m de comprimento, reside tranquilamente… Em grande parte da fazenda é possível encontrar plantações de dendê e açaí junto ao cacau cabruca. A água captada da chuva é usada para atender ao viveiro, onde são cultivadas as mudas de cacau, biri biri, bananeiras, mangueiras e tantas outras árvores frutíferas, além de plantas ornamentais, orquídeas e flores.
Semanalmente as “Delicias do Arimuguê” (whatsaap 1 (954) 383-4799) descem da fazenda até a Vila de Santo André e são entregues nas casas dos que encomendam via whatsaap seus produtos: verduras, frutas, cocos, além de plantas, doces, mel e compotas diversas. Em breve o Projeto Arimuguê estará apto a receber visitantes que, além de conhecerem um pedaço da mata atlântica, poderão saborear as Delicias produzidas pela Da. Dolores… Turismo sustentável, este é um caminho para a região.
*Chegança – festa popular de origem lusa que, ao chegar ao Brasil, transformou-se em comemoração típica que compõe o ciclo natalino. Durante a apresentação, o grupo conta a história das lutas travadas entre mouros e cristãos (cujo propósito era expulsar o mouro invasor) relatando acontecimentos marítimos.
*Léa Penteado é jornalista, foi repórter especial, colunista, editora e diretora na Bloch Editores, Editora Abril e jornal O Globo. Trabalhou como assessora de imprensa nas três primeiras edições do Rock in Rio e foi diretora de comunicação e conteúdo da primeira edição do Rock in Rio – Lisboa. Coordenou a comunicação do projeto Roberto Carlos 50 Anos de Música. É autora também de Um instante, maestro, sobre o apresentador de TV Flavio Cavalcanti, A Verdade é a Melhor Noticia e O Rei na Terra Santa (sobre o show do RC em Jerusalém). Atualmente é vice-presidente do conselho de turismo de Santa Cruz Cabrália.