Por: AFP/ Agence France Presse. Foto: Max Rossi/ Reuters
Esta é a 298º encíclica da História da Igreja Católica – e a primeira que traz a ecologia como ponto central.
Os defensores do clima e do meio ambiente celebraram nesta quinta-feira as declarações sem precedentes do papa Francisco sobre a necessidade de agir de forma urgente contra o aquecimento global, faltando menos de seis meses para a Conferência de Paris.
Em sua longa encíclica sobre “o cuidado da casa de todos”, o pontífice pressiona os líderes mundiais e, sobretudo, os países ricos, pedindo “acordos internacionais urgentes”, uma revolução econômica e moral para combater a mudança climática e reduzir a desigualdade.
Suas palavras poderiam tornar a questão climática uma obrigação moral para muitos católicos e fortalecer a mobilização para um acordo ambicioso sob os auspícios das Nações Unidas na capital francesa em dezembro.
Com cerca de 1,2 bilhões de católicos no mundo, a encíclica do Papa pode ter um alcance importante, especialmente em regiões onde o pontífice goza de grande influência, como a América Latina e Ásia.
“O papa injetou um elemento moral poderoso em um debate que muitas vezes fica preso à ciência, à política, à economia”, disse Elliot Diringer, do Instituto Centro-Americano de Soluções Climáticas e Energia (C2ES).
“Ele fala para nossa consciência coletiva. Certamente não conseguirá convencer muitos céticos, mas sensibilizará muitas pessoas sobre os desafios e a urgência”, acrescenta.
Em suas 192 páginas, a encíclica contém elementos precisos e apoiados na ciência sobre o papel do homem no aquecimento global e o impacto dos combustíveis fósseis, especialmente carvão.
O documento é parte da mensagem transmitida pela Igreja em suas paróquias e poderia incentivar várias dioceses para participar de um amplo movimento de desinvestimento em combustíveis fósseis, de acordo com a organização 350.org, que começou essa campanha.
– Inversões católicas –
Nos últimos meses, dezenas de instituições religiosas, do Conselho Mundial de Igrejas até a Igreja da Inglaterra, retiraram seus ativos investidos em empresas de gás ou de petróleo.
“Esperamos que a encíclica leve as comunidades católicas do mundo a olhar como seus próprios investimentos, por vezes, podem financiar o aquecimento global”, explicou Ellie Roberts da associação cristã Operação Noé. “É essencial se quisermos reforçar a vontade política para um forte acordo em Paris”.
Vários obstáculos se interpõem no caminho de um acordo que reunirá, por consenso, 195 Estados e promessas concretas de ajuda aos países em desenvolvimento e garantir o controle dos compromissos nacionais em matéria de redução de gases estufa.
A mensagem do Papa “poderia ter uma influência significativa sobre a política dos partidos conservadores em locais, da Austrália aos Estados Unidos, onde os católicos são cada vez mais predominantes”, observou Neil Ormerod, professor de teologia da Australian Catholic University.
Na Austrália, grande produtora de carvão que se recusa a reduzir o uso de combustíveis fósseis, “metade do gabinete do primeiro-ministro Tony Abbott é católica, incluindo o próprio Abbott”, acrescentou, em uma análise publicada no site Theconversation.com.
Nos Estados Unidos, onde os céticos da mudança climática são muito ativos, a encíclica suscitou reações críticas de vários republicanos, incluindo o possível candidato para a Casa Branca Jeb Bush, que é católico, de acordo com a imprensa americana.
O Papa argentino vai viajar em setembro para o Congresso dos Estados Unidos, após visitar a Assembleia Geral das Nações Unidas.
Francisco ressaltou a responsabilidade dos países ricos no aquecimento global, um aspecto-chave das negociações para um acordo em Paris.
Os países em desenvolvimento cobram que mais esforços sejam exigidos dos países industrializados, que alertam para a crescente participação da Índia e da China nas emissões de gases de efeito estufa.
“O papa destaca a atenção que devemos dar aos mais fracos”, um elemento que os negociadores deverão ter em mente até o final, garante Laurence Tubiana, responsável da delegação francesa para as negociações.